Uma amiga, Alice (não a do País das Maravilhas, mas mesmo assim uma maravilha de pessoa), me instigou, recentemente, a escrever sobre “vacas”... Não no sentido pejorativo da palavra (que por sinal nem deveria existir!), mas no seu sentido literal, em estado de dicionário na primeira acepção, pois ela se lembrou da minha paixão por esses animais. Aceitei o desafio e seguem, então, algumas reflexões que espero sejam sustanciosas:
1. A primeira
que me ocorre refere-se justamente à definição da palavra. Em praticamente
todos os dicionários, você encontrará, no sentido primeiro, literal: “Vaca é a fêmea
do boi”! Espera... Um ser tão belo, único na sua individualidade, relegado a
ser apenas “a fêmea”? E se você procurar boi, não vai encontrar como “o macho
da vaca”, mas como: “Animal mamífero artiodáctilo, ruminante, do gênero Bos, da família dos bovídeos”, etc. E nem
precisa ser feminista engajada, de desfilar com soutiens na mão, para não perceber o quanto os dicionários e,
portanto, as palavras, são machistas – é só vermos a famosa discussão sobre
Presidente/Presidenta! Direitos iguais já às vacas!!
2. Já tive uma
grande coleção de objetos em que a vaca era o principal elemento: canecas,
pratos, bichos de pelúcia, fotografias, prendedor de recados, pijama, calcinha,
soutien, adesivos... Eu sempre me identifiquei com esse animal artiodáctilo,
invejando sua mansidão no pastar solenemente nos campos... Costumo brincar com
meus amigos dizendo que, se eu acreditasse em vidas passadas, eu certamente já teria
sido uma vaca: passar oito horas por dia comendo, mais oito ruminando e oito
dormindo – eis um sonho de vida! Salientando: quando penso no “ruminar”, penso
em sonhos feitos e desfeitos; penso em carícias e desejos, que voam espalhados
pelos mugidos...
“Na
solidão da noite
uma vaca, uma abençoada
vaca
muge:
o seu mugido é um rio de
veludo morno,
voz de mãe e de amante:
quente e cariciosa...”
- Mario Quintana
Vamos comer, ruminar e dormir!
3. Outra questão: não seria interessante termos
uma vida mais saudável? Dizem os estudiosos que uma vaca mastiga em torno de 50
vezes por minuto (Tenho um amigo muito muito querido que mastiga umas 60 vezes
por minuto!!), o que a leva – a vaca (!) – certamente, a apreciar muito mais a
comida (Mas isso também acontece com meu amigo, que é um excelente apreciador
de comida!). Ah! E podem consultar os manuais de zoologia por aí para conferir:
dizem que elas bebem em torno de 8,5 litros de água para cada litro de leite
que produzem. Não sei a média de uma vaca normal, mas sei que tem umas que dão
até 20 litros de leite/dia. Multipliquem por 8,5... Se beber água é saúde, haja
saúde em uma vaca!! Por isso, talvez, que elas dificilmente sofram (creio eu)
de constipação, prisão de ventre... Todo dia estão lá, belas e felizes, com
seus 40-50 kg de esterco bem produzidos...
4. Dizem também que as vacas (pasmem!) têm
amigas, e melhores amigas(!), e que quando separadas sofrem de estresse... Isso
acontece comigo. Quando me reúno com minhas BFF, e conversamos e rimos e
bebemos e comemos e falamos dos homens, me sinto renovada, com a alma e o corpo
leves. Inclusive, é possível afirmar que algumas amizades são bem menos
estressantes que alguns relacionamentos amorosos.
5. Hoje, assim como alguns relacionamentos
amorosos, os objetos que eu colecionava estão no passado ou no lixo... Restaram
poucos... Uma pequena vaca francesa de prender recados, que fica na minha mesa
de trabalho; um jogo de xícaras para cafezinho, que uso quando recebo amigos;
duas ou três vaquinhas canadenses que enfeitam meu presépio no final de ano... Precisamos
nos desapegar! As vacas verdadeiras estão aí para provar que andar mais
levemente na vida, sem grandes preocupações ou perturbações, é a melhor maneira
de se viver! Comer, ruminar e dormir!
Abraços!
Seja feliz!
Rosangela Marquezi
Professora de formação e atuação, mas apreciadora
de vacas por opção.
Dicas da Sustância
2. Assistam ao filme argentino “Um conto chinês”, de 2011, estrelado, é claro, pelo meu crush cinematográfico argentino, Ricardo Darín! O filme é uma comédia (com toques de humor negro) e parte de uma história verídica: uma vaca que cai do céu (literalmente). Assisti na Netflix! Não fui conferir se ainda está no catálogo! Corre lá!!
3. Leiam “A lei da Fazenda” (1998), romance de estreia da norte-americana Laura Zigman, em que a autora analisa o comportamento amoroso masculino a partir da seguinte analogia: o homem é o touro que sempre procura uma vaca nova... O livro, divertido e irônico, inspirou o filme “Alguém como você” (2001), estrelado por Ashley Judd (Jane) e um outro crush cinematográfico meu: Hugh Jackman (Eddie). Eu assisti em DVD (na década passada!!)! Vale a pena conferir a “Teoria da Vaca Nova”.
4. Ouçam o álbum “Atom Heart Mother”, de Pink Floyd, conhecido como o “Disco da Vaca”. Por que ouvir? Porque tem uma vaca na capa (a Lullubelle III) e porque é Pink Floyd e esse álbum marca uma nova fase da banda!
5. Leiam a prosa poética de “A vaca e o Hipogrifo” (1977), de Mario Quintana, poeta gaúcho de extremo lirismo. Um livro gostoso de ser lido e degustado:
“Ora, Maria, o meu mundo é de
temperaturas,
tensões
fulgurações.
Eu nada tenho a ver com os sentimentos
humanos!
Por que que tu não és uma vaca, Maria?
Por quê?
Ficaria tudo muito mais simples e
verdadeiro...”
6. Visitem, ou acompanhem pela Internet, a partir
de 26 de abril deste ano (2017), em São Paulo, a 10ª edição da Cowparade
Brasil, o maior evento de arte de rua do mundo, em que artistas têm a chance de
mostrarem seu talento em uma escultura de vaca, em tamanho natural, feita em
fibra de vidro. Informe-se no sítio: <cowparade.com.br>.
6. Ouçam, por fim, a canção da banda britânica
Elbow: “One Day Like This”. Não é sobre vacas,
mas tem a expressão “holy cow”, que é boa de usar (algo como um “puta merda”
nosso!), e cuja letra, quando ouço, me faz pensar na tranquilidade vivida pelas
vacas.