Um dia desses, frente a uma taça de um delicioso vinho branco italiano,
uma amiga disse: “Vamos fazer um brinde diferente! Vamos brindar aos solitários
amores vividos”! Solitários amores vividos... Essa expressão tem peso e verdade. Quem
nunca solitariamente amou? Seja algum amor não correspondido, seja algum amor a
dois solitário...
Amor não correspondido é muito mais comum. Se eu der uma olhadinha para o
passado logo encontro algum perdido em alguma esquina da memória. Lembro até do
primeiro... Eu devia ter uns 11 anos de idade e ele era meu colega de escola...
Amor de criança, nem era ainda adolescente. Chamava-se Jair. Um dia, chorei no
colo de minha mãe falando dele... Ele nem olhava pra mim... Passou. Foi
simples.
Outros vieram... O irmão da melhor amiga da adolescência... Mais velho
e que nem olhava pra mim também (Ah... Como o olhar – nesse caso, o não olhar,
fala); O Charlie, dos Menudos, meu primeiro crush musical...; O primo bonito, bem mais velho; O professor
de X disciplina, recém-formado, do Ensino Médio... Ultrapassam os dedos para
contar... Tantos amores. Com o olhar de agora, entendo que não foram amores...
Mas vai dizer isso para aquele coração sofrido de outrora...
Amor a dois solitário é outra história... É muito
mais dolorido. Porque você viveu aquele amor. O olhar foi correspondido, mas
não da forma como você talvez esperasse. É amor/paixão que entra não de forma
sorrateira, mas avassaladora. E você vive e você sonha e você constrói e você
chora (Mas você também se recupera!). J.R. era/é seu nome. Era um amor
solitário. Hoje, quando penso nele, como nesse momento de escrever essas
reflexões, tenho mais certeza ainda disso... Era vivido, mas não compartilhado,
não exposto, não retribuído de forma equânime... Eu terminei. Não porque não o
amava, mas porque era solitário amar assim. Chorei no ombro de amigas, fiz
terapia, esqueci, lembrei, esqueci, lembrei, procurei... E vi que continuava
sendo solitário. Então, resolveu-se (E é só em horas de vinho tinto com amigos
que ele me vem à memória – ou agora...).
Outros grandes amores solitários ficaram marcados... Ficaram no tempo... Ficaram na
pele... Ficaram na memória... Esvaneceram... Morreram... (?).
Outros, talvez não com a mesma intensidade
desses, podem ser assunto para outro dia...
Reflito sobre isso porque, no momento, tenho tempo...
O coração está vazio. E é engraçado ter o coração vazio. Porque é solitário
também. O coração, não a vida. Esta é boa, segue em frente, é feliz, é triste,
dança, chora, briga, come pudim, bebe vinho. E reflete de vez em quando.
Abraços, seja feliz.
Rosangela Marquezi
DICAS da SUSTÂNCIA
1. Leia o
poema “Só tu”, de Paulo Setúbal, poeta lá do início do Século XX, o qual
transcrevo (pedindo perdão por adaptar para o masculino...), para facilitar a
leitura:
Dos lábios que me beijaram,
Dos braços que me abraçaram,
Já não me lembro, nem sei...
São tantos os que me amaram!
São tantos os que eu amei!
Mas tu – que rude contraste!
Tu, que jamais me beijastes,
Tu, que jamais abracei,
Só tu, nesta alma ficaste,
De todos os que amei...”
In: “Alma Cabocla” (Moita de Rosas), 1920.
2. Ouça “Are you lonesome tonight?, do Elvis Presley. Porque é
linda, e fala de amor e da solidão que este causa. E porque Elvis não morre(u)
nunca!
“Is your heart filled with pain, shall I come back again?
Tell me dear, are you lonesome tonight?”
3. Leia
“Persuasão”, de Jane Austen. A história de Anne que, jovem, se apaixona por
Frederick Wentworth, mas é “convencida” pela família que ele não é a pessoa
certa, e que mais tarde retorna para sua vida, celebra a introspecção de uma
forma comovente, que nos faz torcer pelo amor.
“Seus
sentimentos em relação a um primeiro e sólido vínculo afetivo; frases iniciadas
que ele não conseguia terminar, seus olhares meio esquivos e sua expressão mais
do que um pouco significativa, tudo, tudo afirmava que seu coração no mínimo
estava voltando a considerá-la, que a raiva, o ressentimento, o desejo de
evitá-la haviam desaparecido, e que tinham sido sucedidos não somente por
amizade e apreço, mas pela mesma ternura do passado."
4. Leia
“Pássaros Feridos” (1977), da escritora australiana Colleen McCullough, se você
quiser realmente entender o significado de amores solitários vividos... A
história de amor de Ralph, que é padre, e Maggie é uma das mais bonitas e
solitárias... É um romance épico e bem estruturado. Assista: o livro foi
transformado em minissérie em 1984 (4 episódios) pela rede britânica ABC e no
Brasil passou no SBT, chegando a ultrapassar a Globo em ibope. Ganhou 4 Globos
de Ouro e 5 Emmys. A última reapresentação no Brasil foi o ano passado (2016),
pela Rede Brasil de Televisão.
“Existe uma
lenda acerca de um pássaro que só canta uma vez na vida, com mais suavidade do
que qualquer outra criatura sobre a Terra. A partir do momento
em que deixa o ninho, começa a procurar um espinheiro, e só descansa quando o
encontra. Depois, cantando entre os galhos selvagens, empala-se no acúleo mais
agudo e mais comprido. E, morrendo, sublima a própria agonia e solta um canto
mais belo que o da cotovia e o do rouxinol. Um canto superlativo, cujo preço é
a existência. Mas o mundo inteiro
para para ouvi-lo, e Deus sorri no céu. Pois o melhor só se adquire à custa de
um grande sofrimento”.